LEI MARIA DA PENHA - CONCEITOS APLICÁVEIS
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DECORRE DE
RELAÇÃO E NÃO DE CONVIVÊNCIA
A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça
decidiu que, para enquadrar uma agressão contra a mulher no conceito de
violência doméstica estabelecido pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), basta
que o fato tenha acontecido em decorrência da relação amorosa. Não é necessária
a comprovação de coabitação com o agressor ou de hipossuficiência e
vulnerabilidade da vítima.
O
entendimento unânime da Turma foi proferido no julgamento de Recurso Especial
no caso da agressão do ator Dado Dolabella (foto) contra
a atriz Luana Piovani, que era sua namorada. Ele também foi acusado de agredir
uma camareira que tentou socorrer Luana. Pela agressão à camareira, o STJ já havia condenado o ator a pagar R$ 40 mil de
indenização.
O Primeiro Juizado da Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher condenou o ator a dois anos e nove meses de detenção,
em regime inicial aberto: dois anos pela lesão corporal contra a idosa e nove
meses pela agressão contra a atriz. No entanto, o Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro declarou a incompetência do Juizado da Violência Doméstica, pois considerou que a Lei Maria da Penha não era aplicável ao caso.
HIPOSSUFICIÊNCIA E
VULNERABILIDADE
De acordo com o tribunal fluminense, o campo de atuação e aplicação da lei está traçado pelo
“binômio hipossuficiência e vulnerabilidade em que se apresenta culturalmente o
gênero mulher no conceito familiar, que inclui relações diversas, movidas por
afetividade ou afinidade”.
Para o TJ-RJ, que levou em conta o fato de o
processo envolver pessoas famosas, “a indicada vítima, além de não conviver em
relação de afetividade estável com o ator, não pode ser considerada uma mulher
hipossuficiente ou em situação de vulnerabilidade”.
O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) entrou com Recurso Especial,
ratificado pelas vítimas, no qual sustentou que a pretensão da lei é conferir
tratamento diferenciado à mulher vítima de violência doméstica e familiar, por
considerá-la vulnerável diante da evidente desproporcionalidade física entre
agredida e agressor. Sustentou que a lei considerou também o preconceito e
a cultura vigentes, “os quais se descortinam no número alarmante de casos de
violência familiar e doméstica contra mulheres, em todos os níveis e classes
sociais”. Afirmou ainda que a vulnerabilidade deveria
ser aferida “na própria relação de afeto, onde o homem é, e sempre foi, o mais
forte”, sendo a hipossuficiência, presumida pela própria lei.
RELAÇÃO DE AFETO
No STJ, a ministra Laurita
Vaz, relatora do recurso, explicou que a legislação teve o intuito de proteger a mulher da violência doméstica
e familiar que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral ou patrimonial, “mas o crime deve ser cometido no âmbito da
unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto”.
De acordo com a ministra, a relação existente entre agressor e agredida
deve ser analisada em cada caso concreto, para se verificar a aplicabilidade da
Lei Maria da Penha, “sendo desnecessária a coabitação entre eles”.
A relatora ressaltou que o entendimento prevalecente no STJ é o de
que “o namoro é uma relação íntima de afeto que independe de coabitação;
portanto, a agressão do namorado contra a namorada, ainda que tenha cessado o
relacionamento, mas que ocorra em decorrência dele, caracteriza violência
doméstica”.
Laurita Vaz considerou que a
exigência imposta pelo TJ-RJ, de demonstração de hipossuficiência ou
vulnerabilidade da mulher agredida, deve ser afastada, pois “em nenhum momento o legislador
condicionou esse tratamento diferenciado à demonstração desse pressuposto, que,
aliás, é ínsito à condição da mulher na sociedade hodierna”.
FRAGILIDADE PRESUMIDA
A ministra ponderou que a
diferenciação de gênero trazida pela lei não é desproporcional, visto que a mulher
seria “eminentemente vulnerável no tocante a constrangimentos físicos, morais e
psicológicos sofridos em âmbito privado”, já que o homem “sempre foi o mais
forte”.
Nesse sentido, “a presunção de hipossuficiência da mulher,
a implicar a necessidade de o Estado oferecer proteção especial para
reequilibrar a desproporcionalidade existente, constitui-se em pressuposto de
validade da própria lei”, afirmou Laurita Vaz.
Considerando que a vulnerabilidade
e hipossuficiência da mulher são presumidas pela própria lei, a 5ª Turma cassou
o acórdão do TJ-RJ, restabeleceu a sentença penal condenatória e declarou de
ofício a extinção de punibilidade do ator em relação ao crime contra a atriz,
em virtude da prescrição. A condenação contra a segunda vítima ficou mantida. Com informações da Assessoria de Imprensa do
STJ.
[Revista Consultor Jurídico, 4 de abril de 2014]
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